Presidente da Compesa é condenado por improbidade em Pirapama.

O presidente da Companhia Pernambucana de Saneamento (Compesa), Roberto Tavares, foi condenado por improbidade administrativa por supostas irregularidades em contrato para a construção do sistema Pirapama, que atende, além de bairros do Recife, Jaboatão dos Guararapes e Cabo de Santo Agostinho. Foram condenados também o ex-presidente da companhia João Bosco de Almeida e a ex-diretora de Engenharia Ana Maria Torres. As construtoras Odebrecht, Queiroz Galvão e OAS ainda foram penalizadas.
O juiz Rodrigo Vasconcelos Coelho de Araújo, da 35ª Vara Federal em Pernambuco, apontou superfaturamento por sobrepreço e impropriedades em processo licitatório. O contrato investigado foi no valor de R$ 430.092.831,23, do total de R$ 479.011.238,66 inicialmente destinados ao projeto. Cálculos do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco (TCE-PE) usados no processo apontam sobrepreço de R$ 110.759.338,94, o que foi refutado pelos acusados.
A decisão foi tomada no dia 27 de julho de 2018.
Outra ação
Em outro processo, no âmbito penal, o ex-diretor da Odebrecht no Nordeste João Pacífico, nos depoimentos da sua delação premiada, denunciou que foi acertado com o ex-governador Eduardo Campos (PSB) o pagamento de 3% do contrato para o sistema adutor de Pirapama em contribuição de campanha. O valor equivale a R$ 5 milhões só da Odebrecht. A OAS e a Queiroz Galvão – empresas que formavam um consórcio com a empreiteira – também teriam cotas de participação. “Essas contribuições eram feitas parte, na maioria dos casos, por caixa dois, e em outros casos, em escala menor, por contribuições oficiais”, afirmou. A obra de abastecimento foi uma vitrine do governo Eduardo Campos.
Licitação
As empresas foram escolhidas por concorrência pública para a execução das obras e o fornecimento de materiais. De acordo com a denúncia parcialmente acatada pelo magistrado, antes da abertura do processo que selecionou as empresas, o Tribunal de Contas já havia apontado irregularidades e recomendou o adiamento da licitação, o que não foi cumprido. Segundo o juiz, após a contratação foi apontada a ocorrência de sobrepreço na aquisição de tubos em aço carbono e ferro fundido e na execução das obras e nos serviços de engenharia.
O magistrado ainda afirmou que as recomendações feitas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) durante as contratações não foram cumpridas.
“Embora a aglutinação do objeto não seja vedada, tal medida deve vir acompanhada de elementos concretos atestando a inexistência de prejuízo ou perda de economia de escala, não servindo para tal alegações genéricas sem uma demonstração técnica através de documentos e planilhas. Analisando detidamente os autos, verifico que os réus (ex-gestores da Compesa à época dos fatos) não trazem nenhum estudo detalhado ou planilha de cálculos que venha a comprovar cabalmente a inviabilidade técnica ou econômica de se parcelar o objeto da licitação. Houve apenas alegações genéricas de que a ausência de parcelamento implicaria majoração de custos, pelo volume e especificidades de equipamentos a serem deslocado para as frentes de serviços, pela necessidade de gerenciamento de diversos contratos e pela execução de serviços, sem comprovação de ganhos de escala”, afirmou o juiz na decisão.
Barragem de Pirapama.
“Levando em conta que o orçamento final da obra ficou em torno de R$ 430 milhões, quando sem os tubos seria de aproximadamente R$ 252 milhões, deveriam os gestores se preocupar com as restrições à competição causadas por uma diferença deste tamanho no montante a ser contratado. Afinal, um orçamento mais elevado exige comprovação de qualificação econômica e técnica mais alta, que pode indicar restrição a competitividade e favorecimento a determinados licitantes de maior porte. No caso, a opção dos gestores acabou por restringir a competição na licitação da obra, o que pode ser comprovado pelo fato de que apenas dois competidores (Construtora Passarelli e Consórcio Queiroz Galvão/Odebrecht/OAS) tiveram suas propostas analisadas, sendo vencedor o consórcio formado pelas maiores empreiteiras do país”, considerou ainda.
O magistrado citou que um terceiro consórcio foi inabilitado apesar de um relatório da área técnica e da comissão de licitação defenderem o contrário. “Tal fato é mais um indicativo de frustração do caráter competitivo da licitação para favorecimento ao Consórcio Queiroz Galvão/Odebrecht/OAS”.
Sobrepreço
O juiz considerou que não há provas de sobrepreço nos serviços de engenharia. Apesar disso, em relação à compra de tubos de ferro, apontou que houve irregularidades.
Para o magistrado, os gestores da Compesa deveriam ter procurado diretamente a única fornecedora do produto no mercado no período da contratação, ainda no primeiro governo Eduardo Campos, para verificar a possibilidade desconto, mas, em vez disso, contratou uma empresa de pesquisa de mercado. “A ilicitude da conduta está no fato dos gestores terem tomado como parâmetro a tabela SINAPI à época, sem ter levado em conta os descontos a serem obtidos em função da economia de escala, algo que o TCU já recomendava muito antes da referida nota técnica”, afirma a decisão.
“Acontece que os gestores da Compesa, na condição de dirigentes da companhia de saneamento responsável pelo abastecimento de água e esgotamento sanitário no Estado de Pernambuco, frequentemente adquirem esses tubos, detendo inquestionável conhecimento sobre as condições de mercado desses insumos e do grande percentual de desconto que a aquisição em quantidade desses tubos proporciona (milhões de reais)”, aponta. “Permitiram que o erário público pagasse um valor excessivo por esses materiais e que o Consórcio Queiroz Galvão/Norberto Odebrecht/OAS tivesse um lucro exorbitante em função desse prejuízo ao erário, o que, diante de todas as circunstâncias já analisadas, demonstra que houve favorecimento indevido às referidas empreiteiras”.
Penalidades
Todos os réus foram condenados ressarcir o Estado no valor de R$ 89.518.124,36, dividido entre eles. Além disso, cada uma das empreiteiras deve pagar multa civil de R$ 15 milhões e ficam proibidas de receber incentivos fiscais ou creditícios pelo prazo de cinco anos, caso a decisão seja mantida após todas as instâncias.
Condenados por improbidade administrativa, Tavares e Torres, caso não haja mudanças após o trânsito em julgado, terão os direitos políticos suspensos por cinco anos e deverão pagar multa de 25 vezes o valor da última remuneração nos cargos. João Bosco pode perder os direitos políticos por oito anos e pagar multa de 50 vezes o valor da última remuneração à frente da Compesa.
Defesa
Em nota, a Compesa afirmou que acredita que a decisão será revertida. “Funcionários públicos de carreira, com serviços prestados nos cargos que já ocuparam e conscientes de que atuaram com lisura e zelo com a coisa pública, os gestores confiam na reforma de tal decisão quando do julgamento do processo pelos Tribunais competentes”, diz o texto.
Além disso afirma que “no âmbito do TCU a auditoria em questão ainda não foi concluída, em virtude da defesa apresentada pela Compesa, não havendo, portanto, decisão final do TCU que confirme as suspeitas relativas a eventual irregularidade no Contrato”.
“Esclarecem, ainda, que o Tribunal Regional Federal da 5ª Região reformou decisão anterior do mesmo juiz, que havia decretado a indisponibilidade de bens dos gestores nesse mesmo processo, afastando a responsabilidade dos dirigentes da Compesa, decisão esta que foi confirmada pelo Superior Tribunal de Justiça por unanimidade”, afirma ainda a nota.
Além disso, a companhia defende que Pirapama “foi uma das obras mais importantes para a região metropolitana do Recife, responsável pelo aumento de 50% na produção e foi concluída com êxito para benefício de milhões de Pernambucanos, tendo sido demonstrado pela Compesa a correção dos preços praticados, cujas cotações foram realizadas por técnicos competentes, com base em tabelas oficiais vigentes à época, tendo sido tais preços apreciados e validados pelo Tribunal de Contas do Estado (e confirmados como abaixo do mercado em licitações posteriores feitas pela própria Compesa)”.
Do Blog do Mário Flávio.