Crônica do Dia – Trevas e Luzes – Por Dom Bernardino Marchió.

Na festa da Páscoa comemoramos a vitória de Cristo sobre o pecado e a morte. No entanto, este acontecimento que marcou a história da humanidade e o início da Igreja não é apenas um triunfo da luz e da vida, mas é celebrado no contexto da violência, conflitos e guerras. Até dentro da Igreja surgem divisões e escândalos. Nenhuma criatura humana é isenta das consequências do pecado.
Por isso quero refletir neste artigo o sentido treva-luz!
São termos antagônicos e definem em todas as culturas a noite e o dia, mas também o mal e o bem, a morte e a vida, a mentira e a verdade. Será que tem sentido falar de luz e trevas no nosso tempo em que se troca a noite pelo dia, a luz por holofotes de intensíssima luz, o repulso pela produção, a atividade pelo prazer, a gratuidade pelo interesse? Para isso podem nos ajudar alguns acontecimentos narrados nos evangelhos.
Lucas nos diz, narrando a paixão e morte de Jesus: “Era já mais ou menos a hora sexta (meio-dia) quando o sol se apagou e houve treva sobre a terra inteira até a hora nona (quinze horas) tendo desaparecido o sol.” (Lc 23,44-45a).
É claro que o desaparecimento do sol corresponde à morte de Jesus e as trevas consequentes ao crime praticado por eliminar o inocente, o justo e santo! A própria natureza e o cosmos estremecem diante da loucura da cruz!
No nosso tempo algo parecido acontece e, se faz presente cada vez mais forte um período de trevas, uma prolongada noite cultural e coletiva de perda de sentido que dói na alma das pessoas, que faz estremecer as instituições (família, educação, igrejas, etc.). O mundo parece doente e as relações internacionais entre estados e nações são ameaçadas por ventos de guerra! Assim reaparecem as perguntas inevitáveis e fundamentais: Quem somos? A que viemos? Pra onde vamos? Por que nos agitamos? Que mundo é este? Para que serve ser bom e honesto?
A escuridão do calvário também envolveu e atingiu na alma Aquele que tinha afirmado “Eu sou a luz do mundo! Eu sou o caminho, a verdade e a vida!”, pois gritou: “Por quê?”. Neste grito estão contidos os “porquês” da humanidade de todos os tempos e de todos os lugares! Ele assumiu todas as nossas angústias de tal forma que ninguém pode dizer, nem pensar: Deus não me compreende e está longe de mim e da minha dor.
Talvez na nossa época quem mais intensamente viveu e interpretou o que se passa na humanidade foi Santa Tereza de Calcutá, que deixou escrito:
“Se eu alguma vez vier a ser santa, serei certamente uma santa da “escuridão”.
É alento na nossa escuridão a certeza para a nossa fé o que professamos com toda a Igreja no memorial da suprema entrega de Jesus: Anunciamos, Senhor, a vossa morte! Proclamamos a vossa ressurreição! Vinde, Senhor Jesus!